segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Viver a vida (ou "A vida como ela é")

Posso escolher uma lista de sentimentos ou estados de espírito que passaram por mim na virada do ano. Alegria e tristeza. Cheio e vazio. Tranquilidade e ansiedade. Proximidade e distância. Certeza e dúvida. Beleza e caos. Haja espaço pra tanta ambiguidade. Um lado é razão e o outro é pura emoção, mas já não sei mais qual dos lados está querendo o que, qual está pensando com a cabeça e qual com o coração e muito menos onde foi parar essa tal de razão. Dentro de todas as brigas que se passaram dentro de mim, a maior delas ainda é entre a velha e impulsiva Kelen contra aquela outra que vem tentando dominar este corpo, que quer fazer tudo com calma, pensando bem pra não se arrepender depois.
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"Não dê nenhum passo nem tome decisões definitivas até o dia 18. Procure manter-se calmo e paciente esperando os primeiros sinais do Universo."
(maldito horóscopo!)
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É claro que a vida e a vinda pro Rio de Janeiro são as maiores culpadas por esta ambiguidade toda. Primeiro pela parte mais óbvia (o que não deveria ser novidade nenhuma depois da missão Barcelona 2009): estou longe de pessoas que eu gosto mas perto de tantas outras que me receberam como uma família. Tenho casa, comida e roupa lavada (por mim, mas ali na máquina que está a minha disposição), mas estou sentindo falta de um canto pra chamar de (só) meu urgentemente. Consegui o trabalho que mais queria na vida (na verdade, na verdade, o que eu mais queria na vida mesmo era ganhar na mega e não trabalhar mais), mas estou apenas começando e começar nunca é uma barbada.
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Fora o óbvio, essa cidade por si só já é suficiente para me enlouquecer, me assustando e segundos depois me encantando (e assim sucessivamente). Taxistas que não dão troco, pessoas que me dizem pra não andar ali, não correr aqui e repetem incansavelmente a frase "é muito perigoso", atendimento péssimo em muitos lugares, ônibus parando onde e quando querem, distâncias incríveis de um ponto a outro da cidade... o dia a dia não tem muito de maravilhoso não. Frases como "tô chegando aí" perdem o sentido no Rio. Ou o trânsito, ou a distância, ou a falta de vaga para estacionar, com certeza farão com que tu não esteja chegando mesmo. Se chover então? Ferrou! Alagamento instantâneo, caos instaurado e atraso garantido. O dia aqui tem que ser planejado no momento em que saio de casa de manhã, porque outra frase que perdeu o sentido foi "vou dar uma passadinha ali em casa". No momento em que eu der uma passadinha ali em casa acreditem: ninguém mais me tira de lá. Nessas horas eu admito que sinto saudades imediatas e imensas de Porto Alegre. Da facilidade, da proximidade, da educação. De colocar meu tênis e sair correndo pela Nilo sem nenhuma preocupação. Da amiga ligando e dizendo que está passando ali e de minutos depois escutar ela reclamando que eu demorei demais pra descer. Até do T9 eu ando com saudades! Se vocês me disserem que isso é porque eu não morava na Zona Sul e que a Zona Sul em Porto também é longe, vou dar risada. Longe também já perdeu o sentido. Longe é ir de Porto Alegre a Gramado. E olha, já demorei o mesmo tempo que levo de Porto Alegre a Gramado pra ir de casa até o trabalho por aqui. E vou fazer um desabafo: adoraria poder dizer diariamente e tranquilamente o meu "bah!" sem ouvir alguém comentar que ama o meu sotaque, ou desatar a rir, ou pior: sair automaticamente imitando a Salomé! Devo estar parecendo, mas não estou sendo bairrista, jamais torci pro Rio Grande ser independente nem quero que se exploda o resto do Brasil, juro. Tudo é uma simples questão de... costumes. E de se acostumar com o Caos.
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Tanto que por outro lado, tem a beleza. Quando chega o feriado, o sábado, o domingo, não tem dilema: tem praia. E uma praia com um marzão azul na minha frente nesse caso, não fica a 4 ou 5 horas e uma BR 101 de distância. Naquelas várias horas que passo esticada na areia interrompendo esse fazer nada só pra tomar um banho de mar (o Guaíba ainda não me permite este luxo) ou um mate com limão (já que gosto de mate de verdade é no frio), esqueço de todo o resto. Ou então naquela hora que paro num ponto qualquer do Leblon e acabo dando de cara com a mais nova e bacana pizzaria do bairro. E se andar algumas quadras pra trás acho a casa de sucos mais famosa da cidade, ou se for algumas quadras pra frente chego no lugar com o melhor sanduíche. A cada quadra, um chope gelado a disposição. Uma espiada pra cima e tá lá o Cristo me olhando. Se sair cedo do trabalho? Dá pra parar no calçadão e dar uma caminhada tomando uma água de coco enquanto olho corredores de um lado, jogadores de futevôlei do outro e surfistas mais adiante. Se eu der a passadinha em casa e sobrar disposição pra sair? Opção aqui é que não falta, seja qual for a vontade da noite, é só escolher o bairro conforme o estilo da programação. E não vou nem falar das lojas, das roupas (e do cartão de crédito que tenho deixado em casa). Não tem bairrismo que resista a isso.
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E não demora muito pra algumas respostas aparecerem, tipo a que diz que o Rio (e Barcelona, e Paris, e Gramado, e Porto Alegre, e a Conchinchina) foi feito pra curtir, pra passear, pra se divertir e que com tempo e grana, nossa, essa cidade é mesmo maravilhosa! Mas vem cá, demorei todo esse tempo pra descobrir isso? E tem algum lugar no mundo onde a melhor parte não seja curtir as coisas boas da vida em vez de viver dura, ter que trabalhar e fazer parte do núcleo pobre da novela? Taí o Manoel Carlos e seus personagens que não me deixam mentir!

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