sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Amor aos pedaços

Não quero nada pela metade.
Não quero nada.
Não quero.
Não.

Porque pela metade vai ser sempre muito diferente do que por inteiro.


Amor aos pedaços - reportagem deste mês na revista Vida Simples que mostra um ensaio fotográfico feito em Polaroide pelo fotógrafo Colombiano Juan Felipe Rubio chamado "Escena entre parejas anónimas".

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

É

Aprendendo a soletrar meu nome no Rio:

ka - É - ele - É - ene.

E se eu não falar "É", é isso mesmo, eles não me entendem.

...sempre

Eu nasci assim
Eu cresci assim
Vou ser sempre assim...
Minha mãe só errou meu nome.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Capaz!

"Pesquisa comprova que as pessoas são mais felizes aos finais de semana".
Precisava perder tempo pesquisando isso?

Where the Wild Things Are

- Will you keep out all the sadness?"
- I have a sadness-shield that keeps out all the sadness, and it's big enough for all of us.

Porto Gramado Alegrense

Há alguns dias um amigo de infância me convidou para escrever num Blog sobre Gramado. Como boa (?) gramadense que sou, prontamente topei e em seguida meu nome estava lá na lista dos membros da equipe. Ontem quando abri a página pra começar a contribuir, de preferência fazendo aquilo que mais gosto de fazer, escrevendo, nada aconteceu.

“Merda, fiquei de escrever hoje e eu não funciono assim, eu escrevo quando vem, e não tá vindo!”
(conversa entre eu e eu mesma em voz alta na frente do computador)

Só que eu não costumo parar e ficar na frente do computador tendo esses tipos de conversas comigo mesma confabulando “O que eu poderia escrever agora... deixa eu ver...”. É óbvio que não. O motivo, o assunto, a vontade, a bobagem, o desabafo, vem espontaneamente e de uma tacada só.
Me concentrei na cidade, fechei os olhos e... vou escrever o que mesmo? Em seguida, lendo os posts já escritos e pensando um pouco mais, me dei conta que o problema estava justamente na palavra que usei pra definir o meu amigo: de infância.
Hoje sou uma Gramadense desnaturada e pior: desnaturalizada. Falo de Porto Alegre com uma propriedade (e com um sotaque segundo minha família...) de Porto Alegrense como se fosse tal. Agora então, morando no Rio, às vezes tenho a cara de pau de responder quando me perguntam “De onde você é?”, que eu sou de Porto Alegre, e com a maior naturalidade, não é descaso com a minha cidade não! Descaso é estar com passagem comprada pra fevereiro e março até Porto Alegre e quase implorar pra que meus pais, irmãos e afilhados estejam lá pra eu não precisar ir “até” Gramado! Até porque nos últimos anos Gramado se reduziu a minha família e ao condomínio da minha irmã, pra onde vou e de onde dificilmente saio nas minhas curtas estadas por lá (minhas quase ex amigas que o digam...).
Saí de lá há exatos 20 anos, poderia ser diferente? Gramado pra mim é sinônimo da palavra como descrevi meu amigo: infância (e um pouco de adolescência, ok, eu não era exatamente uma criança quando pulava Carnaval na Minu). É sinônimo das coisas que descrevi no começo do meu primeiro post. Então como eu poderia agregar num Blog sobre a cidade? Falando do waffle do 25 de julho, minha melhor lembrança do jardim de infância? Do nhoque do falecido restaurante do Hotel Balneário? Da carne de panela da vovó Irma hoje reproduzida pelas minhas tias mas não para o grande público, apenas para a família Tomazelli e seus felizes agregados? Do sorvete com cobertura da Velha Bruxa, caro pra cacete, mas maravilhoso? Da pizza da Casa das Delícias que eu nem sei se ainda existe? Ou da torrada completa do Tênis Clube que só o Marino sabia fazer? E se o assunto for diversão, vou indicar a Boate do Tênis, o Music Bar, o Bar dos Metralhas, a Estação Z, a Boate do Laje ou o Vídeo Bar? Além de nenhum deles existir mais, aí eu me entreguei mais ainda: além de tudo, sou uma Gramadense fajuta que passei 8 anos da minha vida estudando em Canela (e mais três em Novo Hamburgo...) e bem mais do que isso: me divertindo por lá, e não em Gramado. Tem o Bill Bar, é verdade. Mas o Bill Bar do meu tempo, tinha até videokê.
Hoje eu sou capaz de saber indicar mais pousadas na Praia do Rosa do que na minha cidade Natal. Mais passeios na região dos cânions do que na Rota Romântica da qual Gramado faz parte.
Juro: poderia indicar quatro lugares que amo: o Moscerino, o San Tao, a Bodega e o Plátano Dourado (não digo que não sei de nada? Nem existe mais!). Acaba aí meu expertise na cidade. E garanto que esses lugares de tão bons, já devem ser tão conhecidos quanto o Mini-Mundo.
Eu recomendo a minha cidade, principalmente e contraditoriamente agora no verão que é quando não faz aquele maldito frio e justamente por isso deve ter 1/10 dos habituais turistas (eu sou demofóbica, não esqueçam nunca disso). E recomendo mais ainda o Blog Destino Gramado para quem estiver indo pra serra. Com certeza vou ler nele tantas novidades quanto vocês. Porque por exemplo pra mim, o Josephina até ontem não era um café, mas sim a casa do meu primeiro namorado.

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Motivo de força maior

Depois da Páscoa do ano passado comprei uma passagem pra Floripa. Não, não foi assim simples, tipo, vou pra Floripa. A data foi milimetricamente estudada entre uma volta de Brasília e uma ida pra Barcelona. Pois a data milimetricamente estudada não chegou a acontecer por causa de um “motivo de força maior” daqueles que ninguém explica, só aceita. Passagem devolvida, milhas reembolsadas, Brasília, Barcelona, Brasil, e de repente... Floripa! Passagem comprada. Não, não foi assim simples, tipo, vou pra Floripa. A data foi milimetricamente estudada entre uma volta de Brasília e uma ida pro Rio de Janeiro. Pois a data milimetricamente estudada não chegou a acontecer por causa de um “motivo de força maior” daqueles que ninguém explica, só aceita. Passagem devolvida, milhas reembolsadas, Brasília, Rio, Ano Novo, e de repente... Floripa! Passagem comprada. Assim, simples. Quinze dias antes e nada tinha mudado. Uma semana antes e a passagem seguia firme. Dia da viagem e eu estava mesmo indo? Cheguei a errar o horário e ir parar no aeroporto uma hora mais cedo do que deveria. Sorte. A chuva teria me deixado presa no trânsito. A mesma chuva que fez o meu vôo  atrasar uma hora. A mesma chuva que fez com que eu, na hora em que estava sorridente e tranquila pintando as unhas de cor-de-laranja no saguão do aeroporto, ouvisse meu nome nos alto-falantesPois é. Foi essa mesma chuva que decidiu que eu perderia minha conexão em São Paulo. Incrivelmente ainda sorrindo conversei gentilmente com meus novos amigos, um time de uns cinco caras da TAM tentando achar a solução pro meu problema:


- Então Senhora Kelen, a senhora vai para casa e volta amanhã para pegar o novo vôo, que sai as seis.
- Olha só. Eu não posso ir amanhã, sabe? Eu preciso ir hoje. Na verdade, eu precisava ter ido na semana passada. Não, no mês passado. Pior, no ano passado!
- Entendi Dona Kelen. Mas é tudo por conta da TAM, sua ida e sua volta de táxi e...
- Pois é, mas tem algumas outras coisas que a TAM não vai poder pagar, sabe? Então, quais são as nossas outras alternativas?
- Bom, quem sabe então a senhora vai a São Paulo agora no seu vôo, a TAM acomoda a senhora lá, e então a senhora pega o vôo das 4 horas da manhã.
- Ó! Já é melhor que a propopsta anterior, mas ainda não serve. Eu tenho certeza que vocês vão conseguir uma alternativa melhor que me faça chegar hoje em Florianópolis!


Incrível o poder da serenidade em alguns momentos. De repente, depois de muito cochicho, uma voz vinda de um rádio diz:

- Ok. Oferece para a cliente o vôo da Gol que sai as dez.
- A senhora quer? Ir de Gol?


Eu sorrio dizendo:

- Eu sabia que vocês resolveriam meu problema!


Quase uma hora depois, do outro lado do aeroporto, o moço da Gol ainda conseguiu me apavorar, olhando sério para a tela até lamentar:

- Desculpa senhora, mas agora só temos lugares de meio.
- Meu amigo, chega lá ainda hoje? Então eu vou até na asa. Do lado de fora!

E enfim, Floripa.
Vocês poderiam me perguntar, o que tem de tão sensacional em Floripa pra gerar essa história toda.  Apenas um “motivo de força maior” daqueles que ninguém explica, só aceita.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Alma

Sempre lamento quando não permito que as pessoas conheçam o que eu tenho de melhor. Mas lamento mais ainda quando são as pessoas que não me permitem mostrar isso.
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"A minha alma tá armada e apontada
Para cara do sossego!
Pois paz sem voz, paz sem voz
Não é paz, é medo!
As vezes eu falo com a vida,
As vezes é ela quem diz:
Qual a paz que eu não quero conservar, pra tentar ser feliz?"
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Esses dias conversava com uma amiga e começamos a brincar:
- Nossa diferença é que eu tenho medo, tu é corajosa vai lá e faz.
- Não é questão de medo ou coragem. O problema é que tu dá dois passos pra frente e um pra trás.
- Vamos ser mais justas, eu dou três passos pra frente e um pra trás. Tu dá cinco pra frente e um pra trás
- Vamos ser mais justas ainda. Eu dou dez passos pra frente. Mas volto correndo pro mesmo lugar.
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O que será de mim ?
Eu já nem lembro "pronde" mesmo que eu vou
Mas vou até o fim.
Como já disse era um anjo safado
O chato dum querubim
Que decretou que eu estava predestinado
A ser todo ruim
Já de saída a minha estrada entortou
Mas vou até o fim."
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Conversava com outra amiga ontem e ela me disse que meu problema era que eu tinha coragem pra fazer as coisas, mas que eu não entrava nelas de corpo e alma. Aquilo não saiu mais da minha cabeça. Porque tem alguma contradição nisso. Eu sou do tipo que visto e suo a camiseta. Mas então lembrei de Barcelona, e da viagem que ficou pela metade, pensei no Rio. Será que o problema está na alma que fica estacionada enquanto só o corpo vai viajar?
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"Eu bebi a noite inteira
A noite inteira com o diabo
Ele disse que se eu quisesse
Podia ter tudo, tudo fácil
Era só beber com ele
E depois fazer um trato
Eu vendi a minha alma ao diabo"
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Se eu vendi mesmo a alma ao diabo, com certeza ele mora em Porto Alegre.
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"...Easy! Fique bem easy
Fique sem, nem razão, da superfície!
Livre! Fique sim, livre
fique bem, com razão ou não
Aterrize!
Alma! Isso do medo se acalma
Isso de sede se aplaca
Todo pesar não existe..."

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

E agora pai?

Meu pai sempre me diz que 90% do que eu tenho, em termos médicos, é de fundo emocional. Pois bem. Meu fundo emocional está doente.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

A coisa tá russa

Se no meu ambiente de trabalho circulam artistas, eles também estão trabalhando, logo, nada de gritos histéricos, autógrafos ou fotos. A ética profissional manda não ser tiete. 
Pra mim não tem sido problema. Primeiro, porque nunca fui muito fã de nenhum ator Global (vejam bem, eu falei Global, se o Jude Law ou o Bradley Cooper passassem por mim no meu ambiente de trabalho eu queria mais é que a ética profissional fosse pro inferno), então posso até achar bonitão, olhar de canto de olho, mas nenhum deles vai me causar um ataque cardíaco (eu acho). Segundo, porque se no mundo existem muito mais mulheres do que homens, no meu trabalho não seria diferente, logo, óbvio que eu cruzo com dez vezes mais atrizes do que atores.
Mas hoje foi diferente. Eu estava caminhando pro ponto, quando ouço uma voz atrás de mim, que pergunta: "Qual é uma carne boa pra fazer bife?". Quando me viro pra entender se aquilo era alguma espécie de piada, dou de cara com o Russo (por favor, se alguém não sabe de quem estou falando, clique aqui)! Mesmo depois de uma segunda-feira calorenta e pra lá de cansativa, não tive como não sorrir. Respondi pra ele: "Filé mignon , ué!". E ele segue, "Não, é alcatra". E enquanto a gente caminhava e eu conversava com aquele senhor de mais de 70 anos (40 de TV Globo) sobre carne, sobre o calor, sobre como é chato filmar o BBB e sobre como a gente gosta do Luciano Huck, sentia como se conhecesse ele há anos (o que não deixa de ser verdade já que quando eu era pequena assistia o Cassino do Chacrinha e ele já estava lá há um bom tempo...). E resolvi já que estava fora da área de trabalho, que ele seria o priemeiro e único "galã" com quem tiraria uma foto.
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Eu só queria me depilar, estava tarde, eu estava cansada. Só me depilar e ir embora. Mas a depiladora não. Ela queria conversar. Ela esquecia o papel grudado na minha canela pra falar sobre catástrofes, sobre onde o mundo vai parar, sobre a arca de noé, sobre 2012, sobre o fim dos tempos. Ah não moça, por favor. O sofrimento da depilação não basta? Fim do mundo numa hora dessas?
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Não sou alienada não, e minha depiladora não está mais impressionada do que eu com o Haiti por exemplo. Sou é cagona mesmo. E cada vez que falo nesses assuntos me dá tristeza, medo, pânico, pavor e uma vontade louca de estar com as pessoas que eu amo bem perto e não lá longe, e em seguida dá vontade de me jogar de cabeça em tudo que eu acredito ou quero ou sonho, e me dá vontade de ser alguém e de ser de alguém, porque o tempo que a gente passar aqui, seja ele quanto for, tem que valer a pena. Esses dias li o Millôr no Twitter e ele de uma maneira bem simples definiu: "Aproveita a vida, irmão. Já passou mais tempo do que você pensa".
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Não liguem um tópico com o outro, as histórias não se cruzam: não estou querendo ser do Russo até o fim dos tempos!

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Constatações, conspirações, inspirações

Queria ter uma câmera fotográfica que fosse acionada cada vez que vejo uma foto naquilo que eu vejo. Por que até eu tirar a minha da bolsa, o que era já não é mais.
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Conheci hoje um Francês que se mudou para o Rio e abriu um .... bistrô? Não, um negócio de empanadas argentinas. Pergunto, por que? "Porque de coisas óbvias o mundo já está cheio".
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Vim pro Rio sabendo que não deveria pedir aquelas coisas óbvias: cacetinho, negrinho e tal. Logo depois descobri que perguntar pela parada de ônibus também não me levaria muito longe. Mas a melhor foi eu catando a niqueleira na bolsa. "Cê tá procurando o que?". Respondo calmamente, achando que o problema estava na palavra pra lá de antiquada "níquel": "Moedeira, sabe?" "Hahaha, cê quis dizer porta-níqueis?". Claro, bem mais adequado!
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"Chi lascia la strada vecchia per la nuova sa quello che lascia ma non sa quello che trova" (quem deixa a estrada velha em busca de uma nova sabe aquilo que deixou pra trás mas não sabe o que vai encontrar pela frente). Um bom ditado italiano. Óbvio, mas bom.
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Tudo o que eu queria. Nada do que eu imaginava. Um óbvio complementar ao ditado ali de cima.
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Queria conseguir pedir menos ajuda. Queria poder ajudar mais.
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O universo conspira por nós. Às vezes contra, às vezes a favor.
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Aprendi a não falar enquanto não acho as palavras certas, pra não acabar usando as erradas.
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Ando (des) conhecendo as pessoas.
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E com Saudades. Com S de Sul.

domingo, 10 de janeiro de 2010

Erva daninha

A grama do vizinho sempre é mais verde.
Mal sabemos quanta erva daninha (sempre) tem por baixo.

sábado, 9 de janeiro de 2010

Camille Claudel

"Il y a toujours quelque chose d'absent qui me tourmente"
(há sempre algo de ausente que me atormenta)

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Elenco

Essa cidade é maravilhosa, o problema é eu ser figurante justamente no núcleo pobre da novela.

Oração

Santa máquina do café expresso, protetora dos sem vontade de trabalhar, me mantenha acordada por toda esta longa tarde, amém.

Transporte de pinguins

Meu ônibus aqui no Rio deve ser patrocinado pelo Naldecon.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Viver a vida (ou "A vida como ela é")

Posso escolher uma lista de sentimentos ou estados de espírito que passaram por mim na virada do ano. Alegria e tristeza. Cheio e vazio. Tranquilidade e ansiedade. Proximidade e distância. Certeza e dúvida. Beleza e caos. Haja espaço pra tanta ambiguidade. Um lado é razão e o outro é pura emoção, mas já não sei mais qual dos lados está querendo o que, qual está pensando com a cabeça e qual com o coração e muito menos onde foi parar essa tal de razão. Dentro de todas as brigas que se passaram dentro de mim, a maior delas ainda é entre a velha e impulsiva Kelen contra aquela outra que vem tentando dominar este corpo, que quer fazer tudo com calma, pensando bem pra não se arrepender depois.
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"Não dê nenhum passo nem tome decisões definitivas até o dia 18. Procure manter-se calmo e paciente esperando os primeiros sinais do Universo."
(maldito horóscopo!)
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É claro que a vida e a vinda pro Rio de Janeiro são as maiores culpadas por esta ambiguidade toda. Primeiro pela parte mais óbvia (o que não deveria ser novidade nenhuma depois da missão Barcelona 2009): estou longe de pessoas que eu gosto mas perto de tantas outras que me receberam como uma família. Tenho casa, comida e roupa lavada (por mim, mas ali na máquina que está a minha disposição), mas estou sentindo falta de um canto pra chamar de (só) meu urgentemente. Consegui o trabalho que mais queria na vida (na verdade, na verdade, o que eu mais queria na vida mesmo era ganhar na mega e não trabalhar mais), mas estou apenas começando e começar nunca é uma barbada.
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Fora o óbvio, essa cidade por si só já é suficiente para me enlouquecer, me assustando e segundos depois me encantando (e assim sucessivamente). Taxistas que não dão troco, pessoas que me dizem pra não andar ali, não correr aqui e repetem incansavelmente a frase "é muito perigoso", atendimento péssimo em muitos lugares, ônibus parando onde e quando querem, distâncias incríveis de um ponto a outro da cidade... o dia a dia não tem muito de maravilhoso não. Frases como "tô chegando aí" perdem o sentido no Rio. Ou o trânsito, ou a distância, ou a falta de vaga para estacionar, com certeza farão com que tu não esteja chegando mesmo. Se chover então? Ferrou! Alagamento instantâneo, caos instaurado e atraso garantido. O dia aqui tem que ser planejado no momento em que saio de casa de manhã, porque outra frase que perdeu o sentido foi "vou dar uma passadinha ali em casa". No momento em que eu der uma passadinha ali em casa acreditem: ninguém mais me tira de lá. Nessas horas eu admito que sinto saudades imediatas e imensas de Porto Alegre. Da facilidade, da proximidade, da educação. De colocar meu tênis e sair correndo pela Nilo sem nenhuma preocupação. Da amiga ligando e dizendo que está passando ali e de minutos depois escutar ela reclamando que eu demorei demais pra descer. Até do T9 eu ando com saudades! Se vocês me disserem que isso é porque eu não morava na Zona Sul e que a Zona Sul em Porto também é longe, vou dar risada. Longe também já perdeu o sentido. Longe é ir de Porto Alegre a Gramado. E olha, já demorei o mesmo tempo que levo de Porto Alegre a Gramado pra ir de casa até o trabalho por aqui. E vou fazer um desabafo: adoraria poder dizer diariamente e tranquilamente o meu "bah!" sem ouvir alguém comentar que ama o meu sotaque, ou desatar a rir, ou pior: sair automaticamente imitando a Salomé! Devo estar parecendo, mas não estou sendo bairrista, jamais torci pro Rio Grande ser independente nem quero que se exploda o resto do Brasil, juro. Tudo é uma simples questão de... costumes. E de se acostumar com o Caos.
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Tanto que por outro lado, tem a beleza. Quando chega o feriado, o sábado, o domingo, não tem dilema: tem praia. E uma praia com um marzão azul na minha frente nesse caso, não fica a 4 ou 5 horas e uma BR 101 de distância. Naquelas várias horas que passo esticada na areia interrompendo esse fazer nada só pra tomar um banho de mar (o Guaíba ainda não me permite este luxo) ou um mate com limão (já que gosto de mate de verdade é no frio), esqueço de todo o resto. Ou então naquela hora que paro num ponto qualquer do Leblon e acabo dando de cara com a mais nova e bacana pizzaria do bairro. E se andar algumas quadras pra trás acho a casa de sucos mais famosa da cidade, ou se for algumas quadras pra frente chego no lugar com o melhor sanduíche. A cada quadra, um chope gelado a disposição. Uma espiada pra cima e tá lá o Cristo me olhando. Se sair cedo do trabalho? Dá pra parar no calçadão e dar uma caminhada tomando uma água de coco enquanto olho corredores de um lado, jogadores de futevôlei do outro e surfistas mais adiante. Se eu der a passadinha em casa e sobrar disposição pra sair? Opção aqui é que não falta, seja qual for a vontade da noite, é só escolher o bairro conforme o estilo da programação. E não vou nem falar das lojas, das roupas (e do cartão de crédito que tenho deixado em casa). Não tem bairrismo que resista a isso.
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E não demora muito pra algumas respostas aparecerem, tipo a que diz que o Rio (e Barcelona, e Paris, e Gramado, e Porto Alegre, e a Conchinchina) foi feito pra curtir, pra passear, pra se divertir e que com tempo e grana, nossa, essa cidade é mesmo maravilhosa! Mas vem cá, demorei todo esse tempo pra descobrir isso? E tem algum lugar no mundo onde a melhor parte não seja curtir as coisas boas da vida em vez de viver dura, ter que trabalhar e fazer parte do núcleo pobre da novela? Taí o Manoel Carlos e seus personagens que não me deixam mentir!