domingo, 29 de junho de 2025

Somelier

 São 7:55, sentei agora pra minha primeira refeição em solo Paulista e escrevo enquanto espero o café que escolhi abrir. Estaria tudo bem ser a primeira refeição, não tivesse eu chegado ontem às 18:30 e comido antes disso apenas os seis nachos que vieram no lanche do vôo.

Explico. Tenho uma "profissão" paralela não remunerada em São Paulo: sou Somelier de Flats. Perdi as contas de todos que conheci nos últimos três anos, de retrofits lindos no Centro a edifícios de apartamentos minúsculos e infra de cair o queixo em Pinheiros. Fiquei uma vez na Bela Cintra num lugar que tinha um urso gigante na frente e só pensei: que coisa mais cafona. Mas quando passei da porta e senti o cheiro de baunilha no ar, abri um sorriso. A luz do quarto era branca, me doeu um pouco a alma, mas fora isso (e o urso) foi dos melhores lugares que já fiquei.

Claro que a vida não é um moranguinho, não sou "somelier de vinho caro", que seria muito fácil. Preciso achar flats BBBs, cheirosos e limpinhos e que me permitam ir a pé pro Atelier.

Nesta vinda achei um na mesma rua do trabalho e ontem, depois de percorrer um labirinto, o que é comum nos flats que deixam as unidades de locação numa localização não muito bem planejada, cheguei ao meu quarto. Ao abrir a porta, vi de cara a tampa do quadro de luz caído sobre um fogão duas bocas enferrujado. As paredes manchadas chamavam tanto atenção quanto as saboneteiras sem produtos e com cara de sujas. Acendi a luz do banheiro e o mofo no forro gritou. Usei o vaso e a descarga não funcionou. É, parece que fui enganada pelo rótulo desta vez... Ignorei a política de cancelamento e avisei que não ficaria ali. Não, amiga, uma limpeza não vai resolver, ah que bom que tu me entende, tchau.

Voltei pro Booking e tudo que queria era repetir uma hospedagem pra não ter erro às quase 23hs. Eis que o ursão cafona da Bela Cintra piscou pra mim. Azar da luz branca, vem cá e me dá um abraço,  ursão!

Dezoito tretas de pagamento e um Uber depois, aquele cheirinho de baunilha novamente me fez sorrir. Corri pra pegar um restaurante aberto, mas aos domingos descobri que todos eles fecham as 22hs. Me recusei a jantar Pringles da conveniência, dormi com fome e cá estou.

Mas por falar em fome, meu café chegou.

Brilho

Olhei uma foto hoje no Foco Radical e me achei muito corredora (sendo bem irônica comigo mesma). O engraçado foi que pouco antes, uma pessoa me escreveu dizendo que lembrou de mim pois uma amiga precisava conversar com escritoras de mais de 40 anos pro seu trabalho de TCC. Minha resposta foi: olha, não sei se eu posso ser considerada escritora, mas pode dar meu contato. E de repente associei as duas coisas.

.:.

Faz umas duas semanas que comecei assistir a série The Bear. Meio desavisada, sem pesquisar nada, só porque gostei de um diálogo que vi em uma postagem no Instagram. E que diálogos, simplesmente viciei e devorei a série. São sequências de verdades, e choros, e socos no estômago sem fim. Num desses diálogos veio a palavra paixão. O quanto precisamos muito encontrar aquilo que temos verdadeira paixão em fazer nessa vida. 

.:.

E o que tudo isso tem a ver? Tem a ver que eu acho que corro, mas não sou corredora. Que escrevo, mas não sou escritora. Mas a paixão que sinto pelas duas coisas, faz meu olho brilhar a ponto de dispensar esses títulos. E que no fim, sem os títulos, faço com ainda mais paixão.

terça-feira, 24 de junho de 2025

Ginástica

Ser mãe é uma ginástica.

Semana passada marcaram uma reunião importante em Guarulhos. Quando fui colocar na agenda, dei de cara com "apresentação ginástica Mel". Ah, meu senhor... Não querendo abrir mão de nenhuma das duas coisas, só pedi: eu vou, mas preciso estar em Porto Alegre às sete! Passagens compradas, só dependeria da boa vontade da Azul (e do vendaval que se instaurou em Porto Alegre). Um Uber, um vôo turbulento, um ônibus pro terminal certo, uma reunião de duas horas, uma corrida pra pegar o ônibus de volta ao terminal de embarque, mais um vôo turbulento e outro Uber em meio ao trânsito do fim do dia, e às 18:37 eu descia perto do Colégio a tempo de tentar comprar flores pela apresentação da guriazinha. Frustrada com as duas floriculturas fechadas, fui pro ginásio onde as mães das colegas tinham feito meu papel de maquiadora e cabeleireira além de ter guardado um lugar bem na frente, enquanto o pai organizava a logística do outro filho. Sentei exausta, mas ao ver ela linda correndo até mim e gritando aquele "mamãe" que enche uma casa, meu cansaço praticamente se desfez. E após mais ou menos dois minutos e treze segundos de apresentação, onde minha ginasta acertou metade da coreografia e acertou do jeito dela a outra metade, ela surgiu novamente na minha frente, sorrindo feliz.

- Foi lindo, meu amor! A mamãe tem um mini presente pra ti. Não consegui comprar flores mas trouxe outra coisa...

- Balinha de avião!!! Eu amo balinha de avião mamãe, brigada!

Ô ginástica que traz resultado, se não pro corpo, pro coração.

quinta-feira, 19 de junho de 2025

Histórias

Feriado, chuva, café na cama, slime, tema, cara a cara, tédio... Lucas pede pra jogar vídeo game. Mel me olha e pergunta:

- E agora, mamãe, o que a gente pode fazer... Já sei! Tu lembra que eu sempre te peço pra contar histórias de quando tu era mais nova?

- Tá bem, que história tu quer saber?

De uma vez que tu te machucou. De um Natal que foi bem diferente quando tu era criança. De um aniversário que tu gostou muito quando era adolescente. Da primeira vez que tu lembra de ter ido pra praia. Do dia que tu pegou a Pulguinha.

E assim, juntas procuramos uma cicatriz que se perdeu no meio das ruguinhas da minha testa, resgatamos a boneca que ganhei no Natal que passei mal de tanto comer nozes, olhamos todos álbuns de fotos disponíveis e lá achamos meus 15 anos com minhas melhores amigas, passeamos pela praia dos Ingleses e terminamos lá na Miguel Tostes vendo nossa preta veiusca bem pequeninha. 

E quem diria que o encantamento e curiosidade dela por coisas tão comuns me levassem a re(vi)ver  momentos tão aleatoriamente especiais.

quinta-feira, 12 de junho de 2025

Dia desses conversava com uma amiga em função de algum storie que havia postado e ela encerrou nossa troca falando “sou tua fã”. Fiquei pensando naquilo e me perguntando, por que diabos minha fã? Acredito que passo a impressão de ser uma mulher forte. E não acho que isso seja totalmente ruim, nem totalmente mentira. Mas tenho muitas questões em relação a essa “ditadura da mulher maravilha” e tudo que a gente “tem que” e “pode ser”.

Eu sou forte, mas eu sou frágil.

Eu sou foda, mas eu fraquejo.

Eu abraço o mundo, mas preciso de colo.

Eu sou independente, mas dependo de muita coisa.

Eu tenho minhas conquistas, cercadas de frustrações.

Não é porque eu dou conta, que eu não preciso de ajuda.

Eu tenho atitude, mas morro de medo a cada decisão tomada.

Passo a imagem de uma guerreira, que quer ser um pouco princesa.

E posso até correr com lobos, mas tenho medo deles também.

Talvez minha amiga seja fã de uma mulher que no fundo ainda é uma garotinha.

E apesar de ser dia dos namorados, isso não é [exclusivamente] sobre relações românticas, é [simplesmente] sobre relações.